Já nasceu no meio da mentira. Sua família mentia para ele.
Sua vida era toda errada e ele cresceu no meio do erro. Foi assim que aprendeu
a mentir.
No começo, as mentiras eram bobas. Coisa de criança. Mas
conforme crescia avançava um nível na prática. Logo já estava mestre em fingir
e omitir também. Havia apenas um porém: se o conhecesse logo de cara, talvez
por intuição você não depositaria confiança,
mas bastaria um dedo de prosa para ele te convencer de tudo.
Ele não era bobo, sabia que muitas, talvez a maioria das
pessoas no mundo soubessem mentir tanto quanto ele. Então acostumou-se a mentir
sem sentir remorso. Para ele tudo era um jogo e vencia quem mentisse mais. Isso
era até compreensível, já que ele nasceu no meio do “faz de conta” todo.
Porém, um belo dia teve a chance que poderia mudar sua vida e que
poucos teriam: conheceu uma mocinha
sincera. A mocinha sincera parecia um presente divino, um anjo que caiu na
Terra e que só faltava estar embrulhada. Ela era delicada e tinha a voz suave.
Encantou-se pela tamanha sinceridade da mocinha.
Apaixonou-se instantaneamente, tanto que para ela, ele não queria mentir. Sabia
que a mocinha só merecia verdades.
Além da menina ele ainda conheceu a família dela, pessoas
tão honestas, humildes, sinceras e raras, tão diferentes da família dele. Ele
pensava que na vida da mocinha, era tudo tão certo. E era.
Mas foi então que ele não resistiu e começou com o primeiro
ataque, só para conquistar a mocinha. Teve que mentir, mesmo não querendo,
mentiu para ela pela primeira vez. E não foi só a mocinha quem acreditou, a
família dela também.
Depois disso vieram sucessivos ataques de mentira e omissão.
Ele a amava por demais, mas simplesmente não conseguia parar, estava acostumado
a mentir e não sabia explicar isso. Pela primeira vez começou a bater o
remorso. Ele estava mentindo para pessoas que não mereciam. Desesperou-se. Era
tarde, já haviam se passado meses e a coleção de mentiras que contara estava
quase completa.
De tanto remorso, um dia olhou-se no espelho e sentiu
vergonha. Percebeu que sua vida toda era uma mentira e que o único sentimento
verdadeiro que sentiu por alguém, havia ele próprio, transformado em rascunho
de mentiras.
Estava ciente de que a verdade mais cedo ou mais tarde viria
à tona, porque a verdade sempre vem. Ele iria perder aquela mocinha sincera e
toda a sua família também. Estava ciente de que nunca mais encontraria pessoas
como aquelas...
Quando as verdades vieram à tona, a sensação foi de
fracasso. Ele viu a mocinha amada e toda uma família de gente honesta (que o
recolheu de braços abertos), chorar. Todos estampavam a decepção no olhar.
Então ele foi embora e quando chegou em sua casa, viveu o
último sentimento de verdade que teria em toda a sua vida: tristeza. Provou da
dor que corroeu-lhe o peito e suas pernas trêmulas fizeram-no agachar-se no
chão. Chorou. Chorou de indignação com ele mesmo, chorou de saudade. Guardou
aquelas lágrimas na memória, como se fossem pedras preciosas, porque ele sabia
que nunca mais seria capaz de amar alguém de verdade novamente. Aquelas
lágrimas foram tudo o que restou.
Demorou um pouco, mas quando ele pode se recuperar da dor
voltou a mentir... Começou a viver de amores e amizades de mentira. Mas se
conformou. Sua vida era uma mentira. Conquistava tudo o que queria através de
mentiras e gostava de se enganar com a falsidade ao redor. Gabava-se de uma
felicidade ilusória.
Passaram-se anos desde então, tantos anos que mal se
lembrava da mocinha sincera que ficou no seu passado. Ele se entretia com seus
amigos de mentira e falsos amores. Entre goles de bebida e risadas vazias, mal
podia pensar naquela mocinha que ficou para trás.
Foi aí que um dia, teve uma surpresa, estava ele em um bar
requintado quando avistou a mocinha de longe. Ela já não era mais uma mocinha,
era uma mulher feita. Ela estava com um cigarro entre os dedos e cercada de
amizades que ele bem conhecia. Observou-a de longe toda a noite, chocado com
cada cena que via. Nunca pensou que a veria, muito menos naqueles trajes,
bebendo daquela forma e rindo alto em um tom vazio. Ele a viu lançar olhares
mentirosos a três homens diferentes que a cobiçavam. Ela deu falsas esperanças
aos três. No final da noite ela beijou dois caras com quem nem sequer havia
flertado antes. Ela se insinuava e se exibia de tal forma que nem parecia saber
o que estava fazendo. Continuava linda,
mas jogava mentiras pelo ar com uma frieza imensurável.
Por um instante ele quase correu ao encontro dela. Teve
vontade de agarrá-la e perguntar o que ela estava fazendo. Teve vontade de
dizer que aquilo tudo não era para ela. Teve vontade de gritar que ainda a
amava! Mas quem era ele para exigir algo?
Ele olhou para sua acompanhante, uma garota com quem estava
junto por alguns anos (este era seu último e falido romance de mentira que
vinha durando), então conteve-se. Sabia que aquela garota com quem estava junto
por alguns anos também não o amava de verdade, mas ele não queria trocar o
estável pelo instável, já que a “mocinha sincera” já não existia mais.
Despediu-se de sua acompanhante, alegando um mal estar.
Dirigiu seu carro perdido pelas ruas arrasado, tendo a
certeza de que havia criado um monstro. Agora, tinha plena certeza de que sua
vida estava fadada a ser uma mentira e de que ele e aquela mocinha que ficou no
passado, seriam infelizes para sempre...
Joanna Catharina
17/09/2012
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